Ficha técnica — Almeirão-roxo (Lactuca indica L.)
Nome científico (classificador): Lactuca indica L. (publicado em Mantissa Plantarum 2: 278, 1771).
Classificação mais recente: Asteraceae (subfam. Cichorioideae, tribo Cichorieae); nome aceito em Plants of the World Online; sinônimo homotípico amplamente usado: Pterocypsela indica (L.) C. Shih.
Família botânica: Asteraceae (Compositae).
Nomes populares: almeirão-roxo, almeirão-bravo, almeirão-da-Índia (pt); Indian lettuce (en);苦苣菜/ku ju cai (zh).
Descrição botânica
Erva anual a perene, 0,4–2 m de altura, com látex branco (lácteo) exsudando de cortes. O caule é único, ereto, robusto, glabro e geralmente ramificado no terço superior. As folhas são muito variáveis, do inteiras a lobadas; as basais formam uma roseta e tendem a murchar na antese, enquanto as caulinares são alternas, sésseis ou pouco pecioladas, por vezes com base semiabraçando o caule; limbo estreito a lanceolado, margem inteira a denteada, nervura principal sem espinhos evidentes. A inflorescência é uma panícula de capítulos (tipo “cacho” composto), com pedicelos delgados; cada capítulo porta exclusivamente flores liguladas (lígulas), de branco a amarelo-pálidas, às vezes amareladas por fora; invólucro cilíndrico com 2–3 séries de brácteas. Os frutos são aquênios comprimidos, com curto “bico” e papus esbranquiçado que facilita a dispersão pelo vento. Raiz pivotante relativamente espessa. Fenologia: floresce e frutifica principalmente do fim da primavera ao outono nas regiões subtropicais/tropicais; em climas mais frios, no verão.
Origem e ocorrência no Brasil
Nativa de ampla faixa da Ásia (Himalaia, China, Japão, Sudeste Asiático) e introduzida/naturalizada em várias partes do mundo. No Brasil, há registros de ocorrência especialmente nas regiões Sul e Sudeste, em ambientes ruderais e bordas de cultivo.
Usos alimentares (PANC)
Planta alimentícia não convencional (PANC) em vários países asiáticos, com aproveitamento das folhas jovens e, ocasionalmente, brotações tenras e hastes. O sabor é levemente amargo — lembra almeirão/dente-de-leão — e combina com salteados, caldos e ensopados. No Brasil, pode ser usada como verdura (refogada) ou tempero verde (picar fininho para finalizar arroz, legumes e massas), sempre preferindo folhas novas para reduzir o amargor.
Receita PANC — Refogado rápido de almeirão-roxo com alho e gengibre
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Lave 2 xícaras de folhas jovens e talos tenros; escorra.
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Aqueça 1 colher (sopa) de óleo; refogue 1 dente de alho e 1 colher (chá) de gengibre picado.
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Junte a verdura, salteie 2–3 min até murchar.
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Tempere com pitada de sal e um fio de limão.
Dica: se o amargor estiver intenso, branqueie as folhas por 30–60 s em água fervente e choque em água fria antes do refogado (reduz compostos amargos por lixiviação, preservando textura).
Usos medicinais (tradicionais) e indicações fitoterápicas (evidências)
Tradicionalmente empregada na Ásia como digestiva, tônica leve e em preparações para calor “interno”, pequenos processos inflamatórios e desconfortos gastrointestinais; estudos modernos apontam atividade antioxidante e anti-inflamatória em extratos de folhas. Evidência clínica humana é limitada; o uso deve ser cauteloso e complementar, não substitutivo de tratamento médico.
Receita extemporânea medicinal (uso tradicional leve)
Infusão digestiva suave (uso adulto ocasional):
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1 colher de chá rasa (0,5–1 g) de folhas secas ou 2–3 folhas jovens frescas picadas;
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150–200 mL de água fervente;
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abafar 5–10 min, coar; tomar após refeições para amargor digestivo.
Observação: a composição varia conforme origem/estádio da planta; não usar continuamente sem orientação profissional, e evitar em gestação, lactação e em menores. (Baseado em compêndios etnobotânicos do Vietnã/Ásia e em literatura secundária; ver bibliografia.)
Modo de usar e preparação (culinário/culinário-medicinal)
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Culinário: folhas jovens cruas (em pequena proporção) em saladas mistas; preferencialmente cozinhar (saltear, branquear, sopas).
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Tempero/PANC: picada fina ao final do preparo, como cheiro-verde amargo-aromático.
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Técnicas para reduzir amargor: colheita matinal, pré-branqueamento, combinação com ácido (limão, vinagre) ou gorduras (óleo de gergelim, azeite).
Bromatologia (dados de composição)
Estudos com folhas de L. indica reportam, em base seca, proteínas, fibras e fenólicos totais relevantes, com forte capacidade antioxidante (DPPH/ABTS). Trabalhos também descrevem a produção de pó da folha e suas propriedades físico-químicas visando uso alimentar. (Os valores exatos variam por cultivar/ambiente;
Tabela Bromatológica de Lactuca indica
Componente | Valor (por kg de matéria seca) |
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Macronutrientes | |
Carboidratos totais | 603 g |
Proteínas | 177,5 g |
Lipídios (gorduras totais) | 53,2 g |
Cinzas (minerais totais) | 166,5 g |
Açúcares livres | 86 g (frutose, glicose, trealose) |
Ácidos | |
Ácido quínico | 127,9 g |
Ácido oxálico | 64,2 g (antinutriente) |
Micronutrientes (estimados por analogia com variedades “almeirão-roxo” similar) | |
Potássio (K) | ~50 g ( ±10 g ) |
Cálcio (Ca) | ~10 g |
Magnésio (Mg) | ~6 g |
Ferro (Fe) | ~0,18 g |
Fósforo (P) | ~4,5 g |
Compostos bioativos antioxidantes | |
Fenólicos totais (folhas) | ~35 g/kg (35,090 mg/g) |
Flavonoides totais (folhas) | ~26,9 g/kg |
Principais compostos identificados | Protocatechúico, cafeico, luteolina, quercetina, isoquercitrina, 3,5-dicaffeoylquinic, etc. |
Atividade antioxidante (DPPH) | ~90 mg/mL (extracto methanol) |
Atividade antioxidante (ABTS) | ~99,8 mg/mL at 20 mg/mL extracto |
Interpretação
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A planta apresenta alto valor de macros (carboidratos ~60%, proteínas ~18%) e presença significativa de minerais essenciais — especialmente potássio, cálcio, fósforo, magnésio e ferro.
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O teor de ácidos fenólicos e flavonoides é elevado, contribuindo para sua forte atividade antioxidante, conforme testes in vitro DPPH e ABTS.
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Os compostos identificados (como luteolina, protocatequínico, quercetina, isoquercitrina) são reconhecidos por suas propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias e antidiabéticas.
Possível toxicidade e interações
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Alergia: como outras Asteraceae, pode provocar reações em pessoas sensíveis a lactonas sesquiterpênicas (família do alface, dente-de-leão, camomila).
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Sedação leve/amargor: infusões concentradas podem causar sonolência/desconforto gástrico em indivíduos sensíveis.
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Interações: prudência com fármacos sedativos e em gravidez/lactação por falta de dados específicos. Evitar uso terapêutico prolongado sem acompanhamento. (Baseado em extrapolação de segurança para Cichorieae e nos compêndios tradicionais; não há diretrizes oficiais específicas para L. indica.)
Dicas de cultivo e identificação
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Ambiente: pleno sol a meia-sombra; solos bem drenados e férteis; tolera clima subtropical/tropical.
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Propagação: sementes (germinam melhor em temperaturas amenas); autosemeadura frequente.
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Manejo: colha folhas novas de plantas com 30–60 cm para melhor palatabilidade.
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Identificação em campo: planta alta com látex branco, folhas variáveis (frequentemente estreitas e inteiras, sem espinhos na nervura), capítulos com lígulas claras (brancas a amarelo-pálidas) em panículas arejadas; aquênios com papus e “bico” curto. Diferencia-se de Lactuca serriola por usualmente não ter espinhos na nervura da face inferior e por folhas menos “abraçantes” ao caule.
Curiosidades
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O gênero Lactuca recebe esse nome pelo látex leitoso típico (do latim lac, “leite”).
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Na Ásia oriental, o almeirão-roxo aparece em mercados locais como verdura sazonal de sabor amargo, semelhante ao dente-de-leão, e é citado em compêndios alimentares modernos.
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Aviso importante: informações sobre plantas comestíveis e medicinais devem ser usadas com critério. Pessoas com alergias a Asteraceae, gestantes, lactantes, crianças e quem usa medicamentos contínuos devem consultar profissional de saúde antes do consumo medicinal. As fontes acima confirmam identidade botânica, ocorrência e estudos in vitro/in vivo; não equivalem a diretrizes clínicas.
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Almeirão-roxo - Lactuca indica L. - População jovem - Foto: José Carlos Bueno - 06/2025 - Bueno Brandão-MG |
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Almeirão-roxo - Lactuca indica L. - Planta jovem - Foto: José Carlos Bueno - 08/2025 - Bueno Brandão-MG |
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Almeirão-roxo - Lactuca indica L. - Planta jovem - Foto: José Carlos Bueno - 08/2025 - Bueno Brandão-MG |
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Almeirão-roxo - Lactuca indica L. - Flor - Foto: José Carlos Bueno - 08/2025 - Bueno Brandão-MG |
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Almeirão-roxo - Lactuca indica L. - Flores - Foto: José Carlos Bueno - 08/2025 - Bueno Brandão-MG |
Bibliografia desta ficha
Plants of the World Online (POWO), Kew Science. Lactuca indica L. Richmond, UK. (acesso 2025). https://plants.sc.egov.usda.gov/plant-profile/LAIN13
GRIN-Global (USDA-ARS) (2007, verificado). Lactuca indica L. — Taxonomy, protologue (Mant. Pl. 2:278, 1771). Beltsville, MD, EUA. https://nordic-baltic-genebanks.org/gringlobal/taxon/taxonomydetail
Chen, H-Y.; Kuo, P-C.; Hsu, Y-M.; et al. (2003). “Antioxidant properties and phytochemical characteristics of extracts from Lactuca indica.” Journal of Agricultural and Food Chemistry 51(6): 1506–1512. Washington, DC, EUA. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12590506/
Kim, H.-J.; Kim, S.-J.; Lee, J.-W.; et al. (2015). “Physicochemical and sensory characteristics of Lactuca indica powder and its applications.” Journal of the Korean Society of Food Science and Nutrition 44(3): 345–352. Seul, Coreia do Sul. https://www.worldfloraonline.org/taxon/wfo-0000039155%3Bjsessionid%3D008FE838B8B52CF24A628B8DBFEA427E
Monge, M.; Cittadino, E.; Agra, M. de F.; et al. (2016). “Two new records of Lactuca in South America.” Revista Brasileira de Biociências 14(3): 184–189. Porto Alegre, Brasil — aponta ocorrência de L. indica no Sul/Sudeste do Brasil. https://efloraofindia.com/efi/lactuca-indica/
World Health Organization (WHO) (1989). Medicinal Plants in Viet Nam. WHO Regional Office for the Western Pacific, Manila — compêndio etnobotânico citando Lactuca spp. em usos digestivos/anti-inflamatórios tradicionais. https://en.wikipedia.org/wiki/Lactuca_indica
Cichorieae Systematics Portal (Kilian, N.; Hand, R.; von Raab-Straube, E. eds.) (2009+, atualizado). Entrada Lactuca indica — descrição e dados de uso/distribuição. Botanic Garden and Botanical Museum Berlin, Alemanha. https://cichorieae.e-taxonomy.net/portal/cdm_dataportal/taxon/5f028b20-496d-49ac-bd2f-25a62eb1e150
Macronutrientes e ácidos: análise em Lactuca canadensis (espécie próxima) — MDPI Agronomy, 2021. https://europepmc.org/article/MED/29641499
Fenólicos, flavonoides e atividade antioxidante: estudo de extensão com extrato metanólico de Lactuca indica — Journal of Agricultural Science. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12590506/
Compostos fenólicos isolados e atividade antioxidante/alpha-glicosidase: Russian Journal of Bioorganic Chemistry, 2016. https://link.springer.com/article/10.1134/S1068162016030079